TEKOHA GUASU
OCOY-JACUTINGA

O Tekoha Guasu Ocoy-Jacutinga foi um espaço fisico que foi sendo reduzido ao longo do tempo. A submersão do Tekoha Jacutinga pela Usina Hidrelétrica Itaipu foi o ponto alto do ciclo de esbulhos a que os Guarani da região foram sendo submetidos, especialmente desde os anos 1950, com a concessão de suas terras para os colonos e um projeto de integração para o desenvolvimento nacional ancorado na produção de energia. O período ditatorial foi especialmente cruel para os territórios, e o Povo Guarani foi sendo expulso para Paraguai, Argentina e para as regiões Sul e Sudeste do Brasil. Daniel Lopes, vice cacique do Tekoha Ocoy, conta que voltou para a aldeia em 1986, aos 9 anos, junto com sua mãe e que cresceu aqui.


Segundo ele, essa aldeia surgiu em 1982, com o alagamento de Jacutinga. Na ocasião, 19 famílias vieram para essa reserva com 232 hectares. No início eram poucas pessoas e aquelas que haviam sido expulsas regressaram e também tiveram filhos. Na aldeia que havia sido projetada para 60 famílias, vivem hoje 220 famílias e possuem muitas dificuldades por causa do espaço. De fato, quando se observa o mapa vemos que Ocoy está confinado entre o agronegócio e a reserva de Itaipu, sem possibilidade de expansão e sem recursos para recuperar a paisagem de modo a manter as práticas culturais tal como deveriam ser. Não tem mato, não tem caça e nem biodiversidade. Isso tem efeitos severos sobre a saúde mental e os modos de ser Guarani.


Até este momento, não houve devolução do território ancestral, o que fez com que houvessem esforços de retomada para manter a sobrevivência dos guarani na região.“Antigamente, Ocoy-Jacutinga existia, assim, de forma física mesmo, de Foz do Iguaçu a Santa Helena,havia muitas aldeias. Hoje, Ocoy-Jacutinga é a expressão da luta. Depois de muita luta e conversa com as lideranças mais velhas, nós começamos a reivindicar espaço e toda a luta surgiu dessa aldeia. A primeira conquista foi o Tekoha Añetete, depois o Tekoha Itamarã. Hoje em dia temos retomadas na região, é o que chamamos de Ocoy-Jacutinga, agora o nosso desejo é que seja demarcada a região, que se especifique o nosso território. No entendimento das lideranças, sem espaço não há cultura porque a forma como nos relacionamos com a natureza é diferente, a nossa relação com a terra é diferente, nossas crianças, nossos mais velhos dependem muito da terra e do território.

Falando sobre o nosso Tekoha Ocoy, é importante levar em conta, sempre, o grupo inicial que chegou no território. “Quando penso naquelas 19 famílias que vieram aqui, eu imagino assim, sendo um sofrimento naquela aldeia toda que tinha plantação, que tinha uma história. De repente chegou Itaipu e tinha que mudar para cá, imagina a cabeça do cacique daquela época? Apesar de o cacique Fernando não ter estudo, ele queria deixar para nós para a gente lutar de novo e eles vieram para cá”. Nesse sentido , o que se apreende é que o território é expressão de resistência e de luta para não perderem todo o seu território ancestral.

Os laudos que levaram à remoção das famílias e da sua identificação como não indigenas, facilitaram o despojo das famílias. Ocoy se pretendeu um espaço provisõrio para as comunidades porque já naquela época havia a clareza de que as terras não atendiam as necessidades de vivência tradicional. “Você sai de um espaço que você tem casa de reza, tem sua plantação, animais, tudo a família ali. Lógico que a gente não vai conseguir tudo aquilo que já estava conquistado naquela época, mas aqui é o recomeço de tudo sabe?” O que se quer, liderança, professores, comunidade, Chamõi Kuera e Charyi Kuera é pensar em cada comunidade, como terão autonomia e terem respeito por si e por sua história.


Segundo Daniel, a comunidade sabe o que quer, “não pode vir qualquer pessoa achar que está ajudando e criar situações de dividir a comunidade seja por interesse econômico, político ou o que for. A gente trabalha tudo junto, sempre levando em consideração aquele sofrimento dos mais velhos”. Sobre o tempo recente, se assinala a necessidade de reconstruir.
Ao falar dos espaços culturais, a visão de Ocoy é de que será um espaço de integração e de fortalecimento da comunidade. “Quando a gente pensou nos espaços que vão ser plantados aqui e em mais duas aldeias, a gente quer que esse seja um espaço de discussão, de reunir a liderança, a comunidade, o jovem. É a gente que vai fazer o planejamento de como vai ser o futuro de cada comunidade. Em primeiro lugar tem que ser nós aqui temos nós aqui junto com o professor, liderança, Chamõi Kuera, Charyi Kuera, jovem, criança”.

Durante as conversas, destacam a importância de levar em conta o sentimento do que é ser Guarani e de se ter um lugar que seja seu, reconhecido individual e coletivamente, por indígenas e não indígenas. “Os espaços têm a função de valorizar o nosso patrimônio histórico e cultural, as nossas ideias, o nosso pensamento para no futuro melhorar e não perder de vista a nossa luta. O espaço é da comunidade, a gente vai trabalhar em cima, nós vamos fazer a mobilização, nós vamos reunir as crianças, nós vamos ficar com todo mundo ali”.

O Tekoha Añetete é uma aldeia que nasce da luta pela reparação da perda do Ocoy. Segundo o Cacique João, ela é fruto de um planejamento de retomada, no ano de 1995. Na ocasião, cerca de 30 famílias se propuseram a sair de Ocoy em razão da invasão ocorrida em Tres Lagoas do Paraná Porã. Em Ocoy, não havia mais terra suficiente para as famílias que haviam regressado para a região de origem ou crescido e, por isso, foram com um requerimento para invadir a Reserva Biológica de Itaipu Binacional.

“Amanhecemos em uma quarta-feira, lá na reserva de proteção do Lago de Itaipu e fomos 30 famílias para requerer nosso direito. Fizemos pressão para compra, no outro dia Itaipu jã e movimentou e chegaram no acampamento juntamente com o Ibama para nós ver se tinha acordo e os mais velhos, os mais antigos não aceitaram esta proposta. As 30 famílias não aceitaram e prefere morrer ali no local a sair de lá enquanto não resolveu a situação territorial”. E ficaram acampados ali.

Segundo o cacique, “ficamos ali acampado, nós sofremos chuva e frio, nós sofremos fome também. De vez em quando a FUNAI levava alimentação a cada 15 a 4 dias e ficamos assim por um ano, 96, acampado com a família é difícil também o atendimento da Saúde, de educação”. Nesse momento, decidiram viajar para Curitiba na Secretaria de Itaipu Binacional para dizer para o chefe que queriam resolver a questão do território já.


“Naquele momento, foi feito um termo de compromisso, de uma terra. Fizeram um levantamento nessa região de Diamante do Oeste e concordaram em comprar a Fazenda Padroeira, que o dono era de Cascavel. “Nós saímos lá do Paranã Porã no dia 18 de Abril de 1997, às 10 horas da manhã e chegamos já tarde, acho que 4 ou 5 horas da tarde. Chegamos nessa fazenda, essa aldeia, fizemos moradia, barraco para a gente aqui, nessa terra, para a gente ter casa. Era muito sofrimento, não tinha município, nem governo do Estado, nem Funai e nem Itaipu. A gente lutou muito, eu viajava para Brasília para conversar, veio um engenheiro agrônomo, fizeram um projeto de agricultura familiar e outros pedidos, inclusive para Itaipu, voltar a ajudar porque naquela época falou que já tinha pago tudo a dívida”.

O convênio foi retomado, existem projetos em andamento, e tem sido uma relação em que eles têm atendido ao que a comunidade precisa. Ainda assim, refere que existiram perdas e que essas perdas nunca serão resgatadas. “A gente perdemos nossa terra embaixo da água do Lago de Itaipu, quando subiu água perdemos tudo até nosso cemitério tá embaixo da água essa aí nunca mais a gente vamos recuperar”. Existem preocupações com as futuras gerações porque as famílias crescem e logo não haverá mais espaço. Quando viemos, formamos 35 famílias e hoje somos mais de 100 famílias.

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